quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A MOEDA,  TESTEMUNHO DA HISTÓRIA

    Moulay Sulayman   

    Quando apanhamos o vírus do coleccionismo, as questões que emergem sobre datas, personagens, ou  a decoração das peças, trazem-nos constantemente de regresso à história.
    Para tratar este assunto vou servir-me de uma questão que tem a vantagem de nos fazer viajar no espaço e  no tempo, o que permite fazer a ligação com os nossos campos de interesses.
   Porquê o aparecimento do Sêlo de Salomão  nas moedas de bronze do rei marroquino Moulay Sulayman 1206-1238 H(1792-1822), ?
     Para começar, penso que vale a pena assinalar que na cultura árabe, o valor que é dado ás moedas de ouro, de prata ou bronze, não é comparavel ao que lhes é atribuído no mundo ocidental, que estabelece a base do seu valor quase exclusivamente na nobreza do  metal.
   Nos países árabes, as moedas de ouro ocupam um lugar de destaque nos dotes e grandes transações, enquanto as de bronze são consideradas como um metal pouco nobre.   
   No início do reinado de Moulay Sulayman, a situação económica e financeira do país era tão desastrosa, que era práticamente impossível, ao sultão, produzir moedas de prata para as suas transações devido à indisponibilidade de metais preciosos.
   Ao mesmo tempo que permitia a livre circulação das moedas de prata europeias, Moulay Sulayman, teve a brilhante ideia de substituir o dirham, moeda de prata do país, por uma de bronze marcada com o Sêlo de Salomão no anverso e, por vezes nas duas faces da moeda.
  Chamadas  “Fels Slimane”, (Fels Moulay Sulaymam) essas moedas têm uma figura hexagonal em forma de estrela, formada por dois triângulos equiláteros entrecruzados, com um ponto no centro.

 
4 Fels N.D.(Hégira, 1206-1238), 30mm bronze, sem marca de ateliê, (KM 103)
   
Como é que um simples  símbolo consegue  que a população aceite uma moeda cunhada com um metal  pouco prestigiado?
   Claro que  podemos avançar com a hipótese que foi o Sêlo de Salomão, agora marca do sultão Moulay Sulayman, a causa desta aceitação. É possível, mas os historiadores pensam não ser esta, uma razão suficiente para explicar a reacção positiva da população.
    De notar qua a utilização do Sêlo de Salomão no fels de bronze, foi sempre aprovada pelo povo e durou mais de 100 anos. Só no ano  1310 H, numa tentativa de modernizar a aparência das moedas, é que o Sêlo de Salomão foi substituído, o que deu origem ao descontentamento da população.
   A figura hexagonal era originariamente um escudo feito com duas peles unidas com um rebite de bronze, o que  segundo a  filosofia antiga e medieval, reúne num só símbolo os quatro elementos naturais : fogo, água, ar e terra.
   Como sinal mágico, ele actua como medida preventiva; como um escudo protector. Além disso o seu efeito é reforçado pelo facto de também representar um par de olhos convencionais; uma proteção contra o mau olhado, um poder mágico e um direito.

  
3 Fels N.D. (Hégira, 1206-1238), 25mm bronze sem marca de ateliê, (KM 99.2)

    Temos então nas moedas de bronze do sultão Moulay Sulayman um Sêlo de Salomão que serve de mensageiro ao sultão e, ao mesmo tempo é um sinal de proteção.
    A sua forma particular, com um ponto ao centro que representa um olho, é exclusiva para as moedas de bronze, porque este é considerado um metal pobre extraído das minas e do fogo da fundição, lugares que são frequentados por espíritos malignos e caracterizados por um odor particularmente desagrádavel, que lhe valeu o apelido “del-muntin” (o malcheiroso).
   Com este sinal (o ponto no centro), o metal perde os malefícios da sua origem para passar a ser um objecto benéfico.
   Podemos reconhecer em tudo isto a tenacidade que subsiste das crenças pagãs,  que não são únicamente exclusivas ao Ocidente Muçulmano.
   Moulay Sulayman teve uma excelente  ideia ao introduzir nas moedas de bronze o Sêlo de Salomão. A população,  há mais de vinte anos privada de moedas de prata cunhadas em Marrocos, aceitou-as sem contestar.
   As transações eram feitas com moedas europeias de prata, e com os famosos fels marcados com o Sêlo de Salomão. Esta estratégia salvou Marrocos da crise e, permitiu a estabilização da moeda de prata que tinha perdido 20% do seu valor e  a sobrevivência do comércio externo e interno.
   Aos poucos o dinheiro entrou nos cofres do Estado, o que permitiu ao sucessor  de Moulay Sulayman cunhar novamente moedas de prata. 


1 Fels A.D. Hégira,,1211(1796), 22 mm Bronze, cunhado em Fez,(KM 99.5)
  
   Esta página de história marroquina  sobre  as moedas de bronze cunhadas durante o reinado de Moulay Sulayman, é simplesmente um exemplo de como a moeda é um reflexo da história dos povos.
  O calendário muçulmano começou no ano 622 d. C., o ano da Hégira (fuga de Maomé de Meca para Medina).

M. Geada

BIBLIOGRAFIA

KRAUSE; Mishler(KM)  - Standard Catalog of World Coins
(1) EUSTACHE;  Daniel - Corpus des Monnaies Alawites . Banque du Maroc, 1984













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