sábado, 25 de maio de 2013


Tartarugas de Egina 

 
Segundo os historiadores, foi a ilha de  Egina o  primeiro dos estados da Grécia Antiga, (na Europa),  a cunhar moeda.
Fédon 675-?655, o mais conhecido dos reis de Argos, grande reformador de pesos e medidas, mandou cunhar  as primeiras moedas de prata de Egina.
Com uma tartaruga marinha no anverso, o reverso dividido em várias seções (por vezes no interior de um quadrado côncavo) e anepígrafes, estas moedas em pouco espaço de templo ultrapassaram as fronteiras da ilha e do mundo grego da época. 
Receberam  o nome de obolos, por terem substituído nas transações comerciais os obeloi (espetões de ferro).
Muitas destas barras foram encontradas no templo de Hera em Argos, atadas em feixes de seis, que constiuíam na época um dracma: nome que se nos referirmos à etimologia significava o que se podia conter numa mão fechada: um punhado de seis obeloi.


Uma das muitas lendas diz-nos que Egina tirou  o seu nome de Aegina,  filha do deus rio Asopo, (Pausãnias, II, 20,2; Apolodoro, III, 12,6).
A mesma lenda também atribui a colonização da ilha a emigrantes vindos de Fliunte: no entanto os eginetas consideravam-se argivos originários de Epidauro.

É certo que a ilha foi frequentada por embarcações fenícias,  e foi sem dúvida, devido aos seus contatos e à esterilidade do seu solo, que os eginetas se dedicaram ao comércio marítimo e à venda ambulante.
Heródoto (II, 178) , fala das relações dos  eginetas com o  Egito.
Foram um dos povos que deram origem à cidade de Naucratis no Egito, e que  por cerca do ano 563, construíram nesta cidade para os cidadãos gregos, um templo dedicado a Zeus.  

Os seus barcos forneciam todo o Peloponeso com mercadorias do Oriente.
Tudo isto leva-nos a concluir  que a origem da moeda na  Egina foi uma necessidade comercial, e ao mesmo tempo compreender a razão porque Fidon escolheu Egina para inaugurar a sua reforma há muito pensada, e à cunhagem de uma moeda oficial.

Egina era o centro comercial mais importante da Grécia Meridional, e deu origem a que o sistema monetário egineta ou fedoneano, se alargasse ao Peloponeso, grande parte das ilhas Egeias, e manteve-se como a principal unidade monetária em toda esta  região, até ao fim do século V a.C..

Protegida das invasões pela sua situação insular, Egina era não só um vasto centro comercial, como também o berço de um movimento artístico, conhecido na história da arte grega,  por  Escola Egineta.
Basta percorrer a lista dos artistas eginetas desde Calon cerca de 530 a.C., Onatas cerca de 490-460 a.C., e outros,  para compreendermos o extraordinário desenvolvimento da ilha e da sua supremacia sobre todo o Peloponeso, durante a época a que nos referimos numismáticamente: “as Tartarugas de Egina”.

As célebres esculturas do templo de Afaia que fazem a glória dos museus de Londres e Munique, são o fundamento de um dos capítulos essenciais da história da arte grega, e representam a expedição des Eácidas contra Tróia, sob o comando de Atena, e o combate dos gregos e troianos em  volta  do corpo de Pátroclo (um dos personagens principais da Hilíada).
As técnicas eginetas, em particular  a da fundição do ferro era famosa em todo o mundo helénico, (Pausãnias (V, 25, 13; VII, 5, 5) .

Logo que Atenas constituíu a sua frota e começou a desenvolver o seu comércio marítimo, Egina declarou-lhe guerra.
Heródoto, dá-nos muitos pormenores sobre esta longa e persistente rivalidade entre as duas cidades, originada  pelo domínio do comércio marítimo.
Aquando do conflito entre Beócia e Atenas no fim do século VI a.C., Beócia pediu auxílio a Egina que lhe enviou a sua frota, e juntos  devastaram a Costa de África, numa guerra que persistiu por diversas razões, e com algumas  interrupções até à invasão de Xerxes I no ano 480 a.C., (Heródoto, VIII, 46, 93) .
Numerosa  e forte teria que ser a armada egineta, que aquando da Batalha de Salamina ainda tinha trinta barcos, e destacou-se pela sua tecnica e bravura no combate. (Herodote, VIII, 46, 93).

Peso das moedas que circularam  em Egina
no período anterior a 480 a.C..


Didracma ou estáter---------------------------12,00  a  12,57 grs.  
Dracma------------------------------------------6,00   a    6,28 grs.
Triobolo(hemidracma)-------------------------3,00   a    3,14 grs.
Diobolo-------------------------------------------2,00  a    2,09 grs.
Tremiobolo---------------------------------------1,57  a    1,50 gr.
Óbolo---------------------------------------------1,00   a    1,04 gr.
Hemiobolo---------------------------------------0,50   a    0,52 gr.
Tartemorion------------------------------------- 0,25  a     0,26 gr.

O peso efetivo das moedas encontradas confirmam os dados aqui apresentados, porque se excluirmos dois estáters do museu britânico que por casualidade  têm 13,69 grs. e 12,96 grs. e alguns (raríssimos) entre 12,60 e 12,75 grs., a maioria dos estáters de Egina não excede 12,57grs. e, um caso único (conhecido) com apenas 12grs..
As moedas de Egina, Atenas, Corinto e outras cidades que tinham curso internacional e não apenas local, apresentam uma grande uniformidade de tipos.
Em Egina, foi a  tartaruga marinha, sem dúvida muito abundante nas costas da ilha, a escolhida para o seu brasão.

Estáters tipo tartaruga marinha


 Carapaça lisa, 550-520 a.C. 12,04 grs.


  
 Carapaça lisa, 520-510 a.C. 12,04 grs.

Estas moedas foram classificadas em diferentes grupos segundo o estilo da moeda, arcaico ou clássico.
Os critérios desta classificação são a regularidade do seu contorno, mas também o aspecto da tartaruga no anverso.
A carapaça pode ser completamente lisa, ou marcada por uma linha de pontos, dispostos no sentido vertical, tal como uma espinha dorsal.

Carapaça com uma linha de pontos

 Carapaça com uma linha de pontos.
510-500 a.C.  12,15 grs.


 Carapaça com uma linha de pontos.
510-485 a.C.  12,04 grs.

Sobre as moedas consideradas mais recentes, nota-se que a carapaça da tartaruga tem um contorno quase triangular em forma de escudo, e a parte superior cortada horizontalmente.
As tartarugas ditas do último estilo, têm uma carapaça com a espinha dorsal marcada por uma linha de pontos, aos quais se juntam mais dois laterais perto do pescoço, formando assim uma cruz ou um T.
No reverso o número de secções (de quatro a oito)  também é um elemento essencial para determinar a data da moeda.

Carapaça em forma de escudo


 Carapaça em forma de escudo
Cerca de 525-500 a.C.  12,36 grs.

Deste tipo de tartaruga (raríssimo) carapaça em forma de escudo, após inúmeras pesquisas, e alguns  contactos pessoais, apenas consegui esta foto  do C. N. G.
(Classical Numismatic Group).

Carapaça em forma de T


 Com uma linha de pontos em forma de T
cerca de  510-490 a.C. 12,28 grs. 4

    
 Com uma linha de pontos em forma de T
cerca de 460 a.C. 12,18 grs.  10

Origens artísticas do tipo com a  tartaruga de Egina

Qunhadas em enorme quantidade, ao examinarmos as séries monetárias com a tartaruga de Egina, ficamos surpreendidos porque motivo uma cidade à frente de um comércio tão importante, com uma escola de escultura tão famosa, produziu durante dois séculos moedas tão imperfeitas .
Na Egina, a moeda permaneceu simplesmente um instrumento comercial, um produto da indústria ao serviço dos comerciantes, e  não tomou contato com o movimento artístico.

Quanto à razão porque  a tartaruga marinha é representada nas moedas de Egina, os historiadores pensam que a abundância deste animal nas costas da ilha, tenha influenciado os eginetas a escolhê-la como emblema heráldico. 
Todavia os mitógrafos não se satisfazem com uma explicação tão simples. Dizem que a tartaruga para os eginetas representava a abóbada celeste: era o símbolo de Afrodite Urânia "Celestial", (nascida sem mãe do esperma de Úrano).        

Segundo (Pausânias VI 25,2), havia em Olímpia uma estátua criselefantina de Afrodite Urânia, uma obra de Fídias (célebre escultor da Grécia Antiga, 490-430 a.C.), que representava a deusa  com um pé sobre a  tartaruga, e por conseguinte incontestavelmente um atributo de Afrodite Urânia.
Ernest Curtis identificou esta deusa  com a Astarte fenícia, deusa titular da navegação e do comércio marítimo (Num. Chron., 1870, p.103).

Alguns historiadores afirmam que os fenícios erigiram um templo dedicado à deusa Astarte, que dominava o mercado e o porto de Egina .
Ernest Curtius ainda vai mais longe, e afirma que  Fidon instalou o seu primeiro ateliê monetário numa dependência do templo de Astarte, e será por isso que  ele escolheu para o anverso das suas moedas um dos atributos da deusa, a “tartaruga marinha”.
No entanto não existe nenhum documento que confirme esta afirmação, provavelmente imaginada com o objectivo de  apoiar a sua tese, ao afirmar que a moeda tem uma origem héraldica.

Se efetivamente esta Astarte (Afrodite) tivesse desempenhado um papel essencial para a cunhagem da moeda (tartaruga), como o afirma Curtis, e que o seu ateliê monetário estava instalado no templo, porque motivo durante essa época em Egina, a deusa ou o seu templo nunca foram representados em moedas?
Fato muito curioso, porque na época romana é muito frequente encontrar no reverso das moedas cunhadas em Egina, a imagem das antigas divindades da ilha.
Se esta afirmação se revelasse exata, como seria possível que os eginetas tivessem cometido tão grande sacrilégio?
Esquecer a deusa protetora da moeda e do comércio marítimo.

    
 Triobolo, = 3 obolos, com linha de pontos
650-600 a.C  3,01grs.22


 Obolo, carapaça lisa
480-460 a.C. 1,14 gr.6


 Hemiobolo, = 1/2  obolo, com linha de pontos
480-457 a.C. 0,52 gr. 30

Contramarcas sobre as moedas de Egina

Se examinarmos com atençao um lote de moedas de Egina anteriores a 480, ficamos admirados ao verificar que existe entre elas um elevado número de peças falsas: têm o núcleo em cobre ou chumbo, coberto com uma fina película de prata.
Os comerciantes de Egina e outros, não se privaram de imitar e falsificar as moedas do poderoso rei de Argos: daí a dificuldade de a fazer receber pelos comerciantes e banqueiros, que eram obrigados a verificar a qualidade de todas as moedas que lhes passavam pela mão, e contramarcá-las com a sua punção (como no tempo da moeda privada), uma marca de garantia.
Encontramos diversas formas de  contramarcas (ou carimbos) de particulares nos  estáters de Egina: palmas, liras, animais, e outros.

Contramarcas (ou carimbos)
Tartarugas marinhas


 Carapaça lisa, século VI a.C.

 Carapaça lisa, 500-480 a.C.

 Carapaça lisa, cerca de 480 a.C.

 Carapaça lisa, 470-460 a.C.

 Carapaça lisa, cerca de 460 a.C.

Última evolução das tartarugas

Após o ano 480 a.C., o aspecto da tartaruga sobre as moedas de Egina mudou.
A carapaça do animal deixou de ser decorada com uma linha de glóbulos, e aparece cunhada com um triplo alinhamento de glóbulos, por vezes autênticas obras de arte. 

Estáters tipo tartaruga terreste

   
 Cerca de 475 a.C.

  
Cerca de 400 a.C.   

Estas são as moedas do conflito entre  Egina e Atenas, quando após a expulsão dos Persas, a luta continuou ainda mais violenta, na qual Egina foi vencida e o seu comércio,  a  indústria, as suas artes, e a sua  moeda ficaram arruinados.
Derrotados uma primeira vez numa batalha naval no ano 460 a.C., os eginetas foram derrotados  numa segunda batalha no ano 456 a.C..
(Na mesma época os seus aliados tebanos também foram vencidos na batalha de Enofita no ano 457 a.C.,)
Depois de vencida e anexada ao Império Ateniense: Egina ficou a pagar um tributo anual, e a  frota ateniense  comandada por Tolmides passou  a dominar toda a costa do Peloneso.

MGeada

Bibliografia
J. Babelon, "La numismatique Antique", Collection Que Sais-Je, 1944
G.K: Jenkins – Monnaies Grecques, 1992.
Ph.: Grierson – Monnaies et Monnayage, Aubier, Paris, 1976.
Vigne: Jean Bruno – La Vie des Monnais Grecques, J. D. Editions, Paris 1998.
Dominique Gerin, Catherine Grandjean, Michel Amandry, François de Callatay – La Monnaie Grecque, Ellipses Édition Marketing S.A., Paris 2001.
Blanchet ; A.- Les Monnaies Grecques, Paris 1894.
Cibray : Gabriel – La Grèce Antique par ses monnaies,  Idon 1988.

http://www.lesitedelatortue.com/monnaies.htm
http://www.romancoins.info/Greece1.HTML#athina
http://www.monnaiesdantan.com/


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