sábado, 25 de setembro de 2021

 


Tibério: um  personagem interessante  

Tibério Cláudio Nero César  (em latim, Tiberius Claudius Nero Caesar), 16 de novembro de 42 a.C. – 14 de março 37 d.C..

Filho de Tibério Cláudio Nero e de Lívia Drusa (ou Drusila), e  sucessor de Augusto, dirigiu  o ainda recente principado romano de 18 de setembro de 14 d.C, até à sua morte em 16 de março de 37.

Talvez por não ser tão megalomaníaco como os seus antecessores Júlio César e Augusto, Tibério é menos conhecido que estes na história de Roma.

Personagem tímido e reservado, Tibério oferece um perfil triste, no entanto o seu reinado é muito interessante por ser o primeiro a instalar-se à frente do principado; o novo regime político estabelecido por Augusto.

Tentar descrever a sua vida, sua estranha personalidade, relação com o poder, saber qual foi o seu impacto sobre as instituições do império ainda recentes e incertas, não é uma tarefa fácil.

De ascendência nobre, sabemos que Tibério nasceu em Roma (no Palatino), 16 dias antes das calendas de dezembro. (Suetónio., Tibério., V).
Seus pais Tibério Cláudio e Lívia Drusa (Júlia Augusta após 14 a.C.), eram ambos descendentes da família Gens Cláudia, célebres por possuírem muitos servos.

Tibério nasceu numa época de grande agitação, na ocasião as guerras civis proliferavam e acabaram por derrubar o velho regime republicano.

Quando Augusto tomou o poder, impôs um regime autocrático (o principado) que apenas guardou as aparências formais da República.

Otaviano-Denário cunhado em Roma no ano 29 a.C.
Anv.Uma Vitória na proa dum navio, com uma coroa na mão direita.
Rev. Quadriga triunfal à direita,  IMP CAESAR
(Ref. RIC-264, RSC-119, Sear5-1555)

No ano 39, Tibério Cláudio Nero cedeu a sua esposa Lívia mãe de Tibério e  já grávida de  Druso a Otaviano, a quem mais tarde o senado atribuíu o título de  Augusto.
Segundo Suetónio, esta mudança marital fez-se a pedido de Otaviano, futuro Augusto. (Suet.,Tib.IV).

O destino de Tibério que ele ainda não domina, foi completamente modificado porque com o segundo casamento da mãe, passou a ser enteado de Augusto e assim um  dos principais herdeiros do principado.

Foi aquando da morte do seu pai Tibério Cláudius  Nero, que o jovem Tibério então com nove anos de idade fez a sua primeira aparição pública, quando do alto da tribuna da arenga em Roma pronunciou o elógio fúnebre do seu pai. (Suet.,Tib.,VI).

Augusto-Denário cunhado na Colonia Patricia (atual Córdoba-Espanha) em 20-19 a.C.
Anv. Augusto à direita - CAESAR AVGVSTVS
Rev. Insígnias militares – SIGNIS RECEPTIS   SPQR  CL-V
(Ref. RIC I-87a, BMCRE-422, CBN-1141)

No ano 31 a.C., Otaviano derrotou Marco António na Batalha de Áccio.
Aquando do festejo deste  triunfo organizado em Roma no ano 29 a.C., Tibério também participou na cerimónia montado num cavalo branco, precedendo o carro triunfal.

Dois anos depois vestiu a Toga Viril e casou com Vipsânia Agripina, filha de Vipsanius Agripa, um grande amigo de Augusto, e tiveram um filho: Druso.

Tibério continuou a aprendizagem das funções civis.
Aos 17 anos é nomeado Questor, era membro do corpo consular e pretor; tudo isto cinco anos antes  da idade normal. (Suet.,Tib. IX).
Como advogado também defendeu vários casos.

Augusto-Denário cunhado em Caesaraugusta (Saragoça, Espanha) 18-17 a.C.
Anv.Augusto laureado à direita.
Rev. Dois ramos de loureiro, CAESAR AVGVSTVS.
(Ref. RIC I-33a, BMCRE-352, RSC-47)

A sua educação diplomática e militar teve lugar em todo o império, e foi como tribuno militar (tribunus militum) que participou na expedição de Augusto na Cantábria.

No ano 20 a.C. à frente dum exército portegeu as conquistas de Augusto no Oriente.
Como diplomata colocou o rei Tigranes no trono da Arménia, e negociou com os partos o regresso das insígnias militares perdidas por Crasso, na Batalha de Carras no ano 53 a.C. .

No Ocidente durante um ano governou a Gália Cabeluda, (nome que os romanos atribuiam a uma parte da Gália em que os habitantes usavam os cabelos longos), perturbada por incursões dos bárbaros e discórdias entre os seus chefes. (Suet.,Tib. IX).

Guerreou na Récia e na Vindelícia, submeteu os povos bárbaros dos Alpes, e na margem esquerda do Reno proibiu a 40 000 germanos de sair da região sem consentimento das autoridades romanas.

Este percurso, explica em primeiro a posição social de Tibério que, como membro da aristocracia patrícia,  seguia naturalmente o“Cursus Honorum”, carreira das honras por vezes (segundo Suetónio) ultrapassando as etapas.
(Cursus Honorum: curso honorífico, ou caminho das honras que designava o percurso nas magistraturas exercidas pelos políticos da Antiga Roma.
Entre outros, para exercer  estes cargos era necessário por exemplo já ter uma certa idade).

Quanto a magistraturas, não sómente ele as abordou antes da idade,  como também percorreu o ciclo questura, consulado e pretura, quase sem interrupção. (Suet.,IX)

Esta rápida carreira também deve ser vista no contexto da sucessão de Augusto, porque ele favorisa deliberamente a sua família os Julli, em detrimento dos partidários do regime republicano.

Em primeiro,  foi designado como sucessor o seu sobrinho Marcellus, mas como este faleceu prematuramente no ano 23 a.C., Augusto casou a sua filha com M. Vipsanius Agripa para ligar este seu velho amigo à sua família.
Deste casamento oficializado no ano 21 a.C.,  nasceram dois filhos Caius e Lucius (Caio e Lúcio) ambos adotados por Augusto no ano 17 a.C..


De toda esta estratégia, resulta que os enteados Tibério e Druso já não são os primeiros na linha de sucessão, (em primeiro lugar Agripa sucessor designado, e Caio e Lúcio filhos adotivos encontram-se em segundo lugar), sem todavia serem excluídos definitivamente da sucessão,  como príncipes de substituição sempre úteis em caso de situação crítica.


Tibério não ficou muito tempo com o estatuto de príncipe suplente, porque após a morte de Agripa no ano 12 a.C., Augusto adotou nova estratégia matrimonial, e obrigou Tibério a divorciar de Vipsânia Agripina, para casar com “Júlia”, a viúva de Agriga, e também filha de Augusto. (Suet.,Tib.,VII).

Para Tibério que amava profundamente a sua esposa, com a qual vivia em boa armonia, já lhe tinha dado um filho, Druso, e encontrava-se grávida do segundo, foi um verdadeiro martírio divorciar de Vipsânia. (Suet.,Tib.,VII).

Suetónio diz-nos que Tibério não apreciava o procedimento de Júlia.Tácito diz que Júlia desprezava Tibério considerando-o indigno dela.
De qualquer forma casaram mas nunca foram felizes, tiveram um filho que faleceu ainda jovem, e no auge da decadência segundo Suetónio, faziam cama à parte (Suet.,Tib.,VII).

Quanto às relações de Tibério com a sua ex-esposa, Augusto simplesmente proibiu-as em detrimento da felicidade familial, porque ele só desejava um bom sucessor para governar, o que aconteceu com este casamento forçado, com o qual Tibério se encontrou herdeiro do trono de Roma.

Primeiro exílio de Tibério

No início Tibério continuou com as suas atividades de príncipe herdeiro de Augusto.
Foi encarregado de missões importantes na Panónia e na Germânia entre 12 e 6 a.C., onde obteve grandes sucessos militares contra os bárbaros.

Ao mesmo tempo a sua experiência política e titulatura enriqueceu: no ano 7 a.C., é nomeado cônsul pela segunda vez e em 6 a.C. obteve o Poder Tribunício“Potestas Tribunicia ”.(Suet.,Tib,IX)), ainda no mesmo ano sem que nada o previsse, Tibério anunciou que se retirava da vida política!

Para o seu retiro,Tibério escolheu a ilha de Rodes, cujo encanto e salubridade o tinha seduzido num dia em que de regresso duma  viagem à Arménia, ali tinha feito uma pequena escala. (Suet.,Tib.X).

Esta decisão política inesperada, na ocasião causou muita polémica, e  os autores antigos nunca conseguiram saber qual a razão que levou Tibério a retirar-se da vida política. 

Os historiadores Dion Cássio, Suetónio e Tácito, pensaram de imediato que Tibério retirou-se para Rodes para escapar à sua nova esposa Júlia. (Suet.,Tib.,X XI)
Estes autores também evocaram uma razão dinástica: Tibério terá partido para deixar o lugar aos filhos de Júlia e Agripa, Caio e Lúcio.
Esta também terá sido a explicação dada por Tibério após a sua partida. (Suet.,Tib.,X).

No entanto uma grande dúvida persiste, Tibério terá sido forcado por Augusto a exilar-se?
Hipótese interessante  que infelizmente por falta de informação não podemos confirmar.

A psicologia individual  e muito particular de Tibério, explica melhor esta fuga prolongada.
O futuro vai mostrar-nos que era desajeitado, muito tímido em plúblico, e até ao fim da sua vida sempre foi um solitário que preferia o isolamento à vida pública.

Ignoramos portanto se a saída da vida política de Tibério foi voluntária, se esta decisão foi bem acolhida por Augusto, ou se contrariou os seus planos de sucessão?
De qualquer modo, como Druso o irmão de Tibério faleceu no ano 9 a.C. na Germânia (Dio 55,1-2), e Tibério no exílio, é para Caio César e Lúcio Júlio César,  que se viram as esperanças de Augusto.

Apezar de muito jovens, Augusto não só os associou ao poder, também lhes  atribuiu a titulatura de (Princeps Juventitus)Príncipes da Juventude. (Dio 55,1-2).

Augusto-Denário cunhado em Londres, 2 a.C.-4 d.C.
Anv. Augusto laureado à direita,
CAESAR AVGVSTVS DIVI F PATER PATRIAI
Rev. Caio e Lúcio vestidos com a toga apoiados em escudos, simpulum, lítuo, e duas lanças,
AVGVSTI F COS DESIG PRINC IVVENT    CL CAESARES
(RIC I-210, BMC-537, RSC-43a)

A mensagem dinástica é bem veiculada por uma série de moedas das quais o anverso mostra a efígie de Augusto, e o reverso os presumíveis príncipes herdeiros do Império.

No seu exílio Tibério é divorciado de Júlia por Augusto, situação que o encanta, mas que o  isola um pouco mais. (Suet.,Tib.,XI).
Em breve os poderes tribunícios que lhe foram atrbuídos por dez anos também  chegam ao fim e não serão renovados.

O que talvez foi um retiro voluntário, aparece agora como uma verdadeira desgraça, e Tibério só esperava que algum barco lhe trouxesse ordem de Augusto para cometer suicídio (Suet., Tib.,XII).
Esta ordem acabou por não chegar: pelo contrário no ano 2 d.C., apesar da irritação de Augusto, Tibério recebeu ordem para terminar com o seu longo exílio.
(Suét. Tib. XII).

É possível que os pedidos de Lívia (sua mãe) e segundo Suetónio de Caio, tenham sido eficaces, ou então a sorte esteve do lado de Tibério porque no ano 2, Lúcio também faleceu de doença em Marselha, fragilizando assim o plano dinástico de Augusto.

O regresso em boas graças de Tibério

Após sete anos de exílio Tibério instalou-se novamente em Roma «onde se entregou completamente ao repouso, acomplindo unicamente os seus deveres privados, sem tomar parte nas decisões públicas». (Suet., Tib., XV).    

Ainda que politicamente isolado, ele é um possível  recurso para a sucessão de Augusto, hipótese que deve ter tido alguma influência para o seu regresso a Roma.
Depois de Lúcio, foi agora a vez de Caio que faleceu com 23 anos de maneira inesperada, da sequência dum ferimento durante o cerco de Artagira. (Arménia).

Augusto ficou apenas com um recurso: Tibério, que foi de novo designado herdeiro oficial.
O enteado foi adotado como filho por Augusto, no ano 4 da nossa era, ao mesmo tempo que o associou ao governo. 

Augusto adotou igualmente Agripa Postumus, terceiro e último filho sobrevivente de Júlia e de Agripa.
Segundo Tácito, foi uma precaução para assegurar a sucessão. (Tác.,Ann.,I,3).
Também pediu a Tibério que já era pai dum filho legítimo, para adotar Germânico um filho do seu irmão Druso.

Tibério-AE 28 cunhado na colonia Romula (Sevilha-Espanha) 14-19
Anv. Tibério laureado à esquerda,
PERM DIVI AVG COL ROM
Rev. Bustos confrontados de Germânico e Druso,
GERMANICVS CAESAR DRVSVS CAESAR
(Ref. RCP-74, GIC-333)

Augusto que viu os seus planos contrariados pelo destino, resconstituiu novamente um grupo de herdeiros, depois do desastre pessoal que representou para ele a morte de Caio e Lúcio.

A adoção de Germânico é tão interessante como preocupante para Augusto : ele é filho de Druso e de Antónia, ela mesmo filha de Marco António e Otávia, irmã de Augusto.

Esta perfilhação de Germânico por Tibério, terá sido uma estratégia para preservar o sangue dos Julli no poder depois da morte de Augusto, por intermédio dum herdeiro da terceira geração na pessoa de Germânico.
Todavia a carreira de Germânico terminou antes.

No meio de todas estas adoções podemo-nos interrogar sobre a natureza da relação exata entre Augusto e Tibério.
Será que os dois homens se apreciavam realmente ?

Encontramos nos «Res Gestae divi Augusti», que são o testamento político de Augusto, o eco do seu pensamento sobre a morte de Caio e Lúcio : « meus filhos Caio e Lúcio Césares, que o destino me levou quando estavam no auge da juventude».
Isto foi o bastante para que Suetónio escrevesse, que Augusto tinha escolhido  Tibério como sucessor por necessidade, e não por simpatia. (Suet.,Tib.,XXIII).

Além disso, no seu testamento Augusto fala de Tibério com alguma reserva  e descreve-o sempre como meu enteado, enquanto Caio e Lúcio são sempre designados como meus filhos.
O imperador diz ainda que é para interesse do povo romano, mas o termo pode ser interpretado de forma negativa ou positiva.

Tácito também  evoca a ideia que Augusto tinha de Tibério.
Segundo este, quando ele pediu pela segunda vez o Poder Tribunício para Tibério, introduziu no discurso ainda que favorável, algumas reflexões sobre a sua maneira de se apresentar, vestir,  e sobretudo sobre o seu comportamento. (Suet.,Tib.,XXI).

Finalmente Augusto que apreciava pouco a personalidade de Tibério, não se deixou influenciar pelos seus sentimentos.
Procedeu como um bom chefe de estado, e apesar da distância relativa que separa os dois personagens, no ano 4 d.C. Tibério foi designado sucessor oficial de Augusto, cargo que ocupou até ao ano 14.

Em consequência recebeu todos os atributos relacionados com o seu novo estatuto, incluindo o de procônsul atribuído pelo senado, que lhe permitiu dirigir as províncias conjuntamente com o seu pai adotivo. (Suet.,Tib.,XXI).

Quando no dia 19 de agosto do ano 14 Augusto faleceu, (Tibério contava então 55 anos de idade), ninguém contestou a sua legitimidade ao cargo que lhe foi atribuído por Augusto.

Um início de reinado difícil (14-23 d.C.)

Ao imaginarmos a elevação de Tibério ao poder supremo, não podemos esquecer a fragilidade do novo regime estabelecido por Augusto.
Esta situação, ou seja a existência dum regime quase republicano, mas dirigido por um poder pessoal e autocrático, foi sem precedentes e os primeiros atos de Tibério foram inconsequentes.

Um mês após a morte de Augusto o seu testamento foi lido e honrado pelo Senado.
Tibério pronunciou um discurso particularmente confuso, vago, desajeitado, onde falou ao mesmo tempo do principado, da sua própria mediocridade, e disse que só o espírito do Divino Augusto era capaz de manter  o novo regime : o Principado.

Tibério que tinha sido chamado por Augusto para com ele dirigirem os trabalhos, aprendeu o quanto é dificil  o encargo de tudo dirigir.
Numa cidade com tantos ilustres personagens, o governo de Roma não devia ser confiado a um só personagem. mas sim a um grupo, que associando os seus esforços seria mais fácil exercer as funções do Estado. (Tac.,Ann.,I, 11).

Neste grave momento de transição dinástica e instuticional, Tibério utiliza uma linguagem opaca, palavras ambíguas, imprecisas.
Suetónio muitas vezes maximalista relata alguns fatos da seguinte forma.

Depois de convocar o senado em virtude do Poder Tribunício, Tibério começou uma alocução, e de seguida como se sucumbisse a alguma dor, emitiu gemidos profundos dizendo que queria perder não só a usagem da fala mas também a vida, e encarregou o filho (Druso) de ler o discurso. (Suet.,Tib.,XXIII)).

Tácito por sua vez, insiste mais sobre o discurso incoerente de Tibério que semeou a confusão entre os senadores, ao ponte que um deles perguntou-lhe : peço-vos César que nos digas de qual parte do governo vos quereis ocupar ?
Uma questão clara, à qual Tibério respondeu com algumas imprecisões. 
Portanto na realidade ele assumiu plenamente o poder mas recusou o título de Augusto.

Segundo alguns historiadores, Tibério declarou que assumia o poder, sem todavia perder a esperança de se demitir mais tarde.
Suetónio atribuíu-lhe estas palavras : vou assumir o poder até chegar o momento que vos pareça legítimo dar algum repouso à minha velhice. (Suet.,Tib.,XXIV).

A inquietude que sentiram os senadores nesta sessão de “tomada de posse” é exagerada muito além da realidade não só por Suetónio, mas também por Tácito e outros historiadores antigos.

Os historiadores modernos também ficam intrigados com a atitude de Tibério, que seria um medíocre político que procurava imitar a fineza  política e institucional, praticada (com sucesso) pelo seu pai adotivo, mas só conseguiu perturbar as mentes com discursos ambíguos, e um comportamente estranho.

Tácito e Suetónio como escritores não pouparam critícas a Tibério, entre outras  repetirem alguns tipos de cartas enviadas pelo imperador ao Senado.

“Que vos escrever Pais Conscritos,  e como vos escrever ? Ou o que neste momento não vos devo escrever ? Se eu sei que os deuses e deusas me fazem perecer mais cruelmente do que eu me sinto perecer todos os dias”.(Suet.,Tib.,VXVII).

Todo o seu reinado foi assim desconcertante.
Em contrapartida em termos de instituições, Tibério não perdeu de vista o essencial ou seja a preservação do seu poder pessoal.
A supressão de pequenos poderes (políticos) simbólicos dos quais o povo ainda dispunha, ilustra bem este aspeto das coisas.

A eleição dos tribunos da plebe (do povo) realizada anteriormente no Campo de Marte para e pelo povo, passou a ser no Senado.
Segundo Tácito, os senadores também já não tinham que se preocupar a fazer campanhas eleitorais por vezes humilhantes, porque os candidatos eram agora designados sob preposição do príncipe. (Táctito.,Ann.,I, 15).

Contra estas medidas o povo contestou timidamente enquanto o Senado as aprovou.
Fora de Roma, as legiões da Panóia e da Germânia, aproveitaram a oportunidade para se revoltar e exigir melhores condições.

Os soldados (os velhos) estimaram que após trinta ou quarenta anos de serviço, mereciam uma boa reforma e não um novo emprego, porque depois do serviço ativo, eram obrigados a cultivar terras que lhes eram atribuídas, valorizá-las, e ao mesmo tempo tinham por missão vigiar os bárbaros.

Esta revolta que se transformou num verdadeiro campo de batalha, obrigou Tibério a enviar os seus filhos Germânico e Druso para terminar com a rebelião.

Como mau político Tibério desconcertou os senadores: apenas a tomada de posse, subiu a revolta dos exércitos do Reno.
Quanto ao seu governo, respeitou o espírito das instituições estabelecidas por Augusto, reforçando o poder pessoal e dinástico do príncipe, e implementou os seus próprios projetos.

A primeira vítima destas nova sdisposições talvez fosse Agripa Póstumo, filho adotivo de Augusto, assassinado logo após a morte do pai em circunstâncias obscuras.
Segundo Tácito, mesmo sem provas a hipótese da culpabilidade de Tibério. (Tac., Ann.,I,7) neste triste episódio não deixa dúvidas, e a morte suspeita de Germânico no ano 19, também tende a confirmar esta eventualidade. (Suet.,Tib.,XXIV).

 A Germânico que a pedido de Augusto foi adotado (à força) por Tibério, foi-lhe atribuído o poder proconsular, e enviado à Germânia para por fim à revolta das legiões em 14/16.
Vitorioso e gozando de grande popularidade, regressou a Roma onde foi recebido triunfalmente no ano 17.

Germânico-Dupôndio cunhado em 17-19
Anv. Germânico conduzindo uma quadriga triunfal à direita,
GERMANIC CAESAR
Rev. Germânico caminhando para a esquerda, saudando com a mão direita, e um cetro encimado por uma águia na esquerda.
(Ref. RIC I-50, Sear, 1820) 

Depois de ser nomeado cônsul pela segunda vez, Tibério enviou-o pacificar o Oriente, onde depois de derrotar o rei da Arménia, reduziu a Capadócia a uma simples província romana.

Germânico faleceu em Antioquia com 34 anos de idade, após uma longa doença que, segundo Suetónio terá sido provocada por algum veneno que ingeriu. (Suet., Calígula, I).
No seu leito de morte designou como culpado o governador da Síria, Cneu Calpúrnio Pisão um amigo de Tibério.
Com esta acusação feita por Germânico, o mandatário não deixa dúvidas foi Tibério (Tac.,II,69) Ann).

Este foi um caso muito problemático: Germânico era muito popular em Roma, e como reunia qualidades nunca antes alcançadas de corpo e espírito, Augusto que durante muito tempo hesitou se o devia escolher como sucessor, obrigou Tibério a adotá-lo. (Suet.,Calíg. IV).

Germânico não só foi amado pela sua família e toda a aristocrácia romana, mas também pelo povo; a imensa multidão que acolheu o seu cadáver quando do seu regresso da Germânia foi testemunho disso.

Mais, ao terem conhecimento da morte de Germânico, lançaram pedras contra os templos e viraram os altares dos deuses.

Alguns particulares lançaram para a rua os seus Lares (Suet., Calíg., V): o povo revoltado puniu os deuses públicos e privados à pedrada, porque aparentemente foram os responsáveis pela morte deste homem extraordinário.
(Lares (Lararium): divindades domésticas romanas inicialmente associadas a Mane, “divindade proto-romana dos mortos”).
Os Lares passaram a ser cultuados no culto doméstico primitivo, como personificações dos seus antepassados).

Agripina esposa de Germânico, não acreditou na tese da reponsabilidade divina. Segundo ela os responsáveis da morte do seu esposo são humanos.
De regresso com as cinzas do marido, declarou publicamente que o responsável foi Pisão, ao mesmo tempo que dizia que existiam responsabilidades ocultas.

Agripina-Reinado de Calígula-Sestércio cunhado em Roma em 37-41
Anv. Agripina à direita,
AGRIPINA M F MAT C CAESARIS
Rev. Duas mulas puxando um carro funerário à esquerda,
SPQR MOMORIAE AGRIPPINAE
(Ref. RIC-42)

Acusado de homicídio pelo Senado, Pisão sofreu bastante com a hostilidade dos senadores, e muito mais com o ódio do povo.
Tibério por sua vez guardou o silêncio e o seu rosto não deixava transparecer qualquer emoção. (Tac.,Ann,III,15).

Pressentindo que a sua desonra e morte estava próxima, Pisão cometeu suicídio.
Um dia pela manhã foi encontrado em sua casa com um golpe na garganta e a sua espada no chão.
Antes de cometer suicídio, Pisão tencionava ler perante o Senado uma carta com as instruções de Tibério para o assassinato de Germânico, mas não o fez. (Tac.,Ann,III,16).

 Foi com atitude triste que Tibério leu no Senado a última carta de Pisão na qual ele clamava a sua lealdade e inocência. (Tac.,Ann.,III,16).

A causa desta morte ainda por desvendar causou grande polémica.
Alguém terá ajudado Pisão a suicidar-se?
Foi ele que sob as ordens de Tibério assassinou Gremânico?
O mistério continua, mas não há dúvida que com a morte de Germânico, Druso o verdadeiro filho de Tibério, passou a ser o único pretendente legal ao trono de Roma.

Foi após este episódio que entrou em cena L. Aelius Seianus (Lúcio Élio Sejano) um influente prefeito do Pretório.

O reino do prefeito do Pretório 23-31 d.C.

A história de Lucius Aelius Seianus (Sejano), 20 a.C.,-18 de outubro de 31 d.C., foi um acontecimento clássico de mais um ambicioso que tentou instalar-se no trono de Roma.
Prefeito da Guarda Pretoriana, era filho do cavaleiro Lúcio Seio Estrabo e de Coscônia Lêntula Maligunense Galita, em determinada ocasião do reinado de Tibério foi o homem mais influente de Roma.
No ano 15 d.C., auxiliado pelo seu pai, Sejano pôs fim aos motins na Grmânia.
(Foi nesta ocasião que Estrabo foi promovido a prefeito do Egito, o que corresponde a uma brilhante carreira equestre durante o principado).

Segundo Tácito, na época Sejano já ocupava um lugar importante na hierarquia militar; fazia parte da cavalaria pretoriana, (a guarda de elito do imperador), gozava de grande credibilidade junto de Tibério e foi mentor do jovem Druso. (Tac., Ann.,I,24)

Tácito também nos diz que Sejano opôs-se a Agripina, esposa de Germânico e mãe de Calígula, por esta se ocupar de perto e com grande eficiência das questões militares.
Grande diplomata, ela pôs fim à revolta que o nome do príncipe não conseguiu, causando grande irritação aos chefes dos exércitos, (Tac.,Ann.,I,69) que se sentiram humilhados por uma mulher.

Graças à sua lealdade e competência militar, Sejano tornou-se o melhor amigo e mais próximo conselheiro de Tibério.
A sua dedicação é bem ilustrada no acidente de Spelunca (Córsega) no ano 36, quando Tibério almoçava numa caverna natural, houve um desmoronamento de pedras que quase o esmagava, não fosse o reflexo de Sejano que ao risco de perder a vida protegeu Tibério com o seu corpo. (Tac.,Ann.,IV,561.

Suetónio também menciona este acontecimento, diz que várias pessoas foram esmagadas mas fato curioso, não diz nada sobre o papel de Sejano neste acidente. (Suet.,Tib.,XXXIX).

De qualquer forma Sejano era ativo, zelado, e mostrou-se particularmente eficaz durante o incêndio que destruíu o teatro de Pompeu.
Tibério apressou-se a rescontruí-lo e louvou as virtudes de Sejano, dizendo que graças aos seus esforços e vigilância, o incêndio limitou-se simplesmente à destruição do teatro. (Tac.,Ann., III,72).

A intervenção de Sejano também abrange a Guarda Pretoriana, estacionada em Roma.
As nove coortes até então dispersas sobre um pretexto de disciplina e eficiência, foram reunidas num só acampamento, provavelmente no ano 17 ou 18.
(Uma coorte era constituída por 3 manípulos: cada manípulo era formado por 2 centúrias. A centúria era uma unidade de infantaria do exército romano comandada por um centurião, e continha 80 legionários).

Com as tropas de elito reunidas em Roma sob o seu comando, o poder pessoal de Sejano aumentou consideravelmente.
Desde então começou a conquistar as boas graças dos senadores, muitos deles passaram a ser seus clientes, que procuravam obter magistraturas, cargos lucrativos e outros.
Sejano chegou a ter estátuas suas nos teatros e fóruns, o próprio Tibério disse publicamente: ele é o fruto companheiro dos meus trabalhos. (Tact.,Ann.,IV,2).

Druso o filho de Tibério morreu no ano 23, segundo Tácito foi assassinado numa conspiração liderada por Sejano. (Tac.,Ann.,IV,3-8).
Este caso mal esclarecido foi confirmado por uma nota póstuma de Apicata, esposa repudiada de Sejano, oito anos após os fatos.

Suetónio habitualmente grande narrador, apenas assinalou que o assassinato de Druso aconteceu em Roma. (Suet.,Tib.,39).
Assassinato ou morte natural, Druso faleceu no ano 23, e mais uma vez a sucessão dinástica é posta em causa.

Entretanto o Prefeito do Pretório tenta introduzir-se na família Júlio-Claudiana, e no ano 25 pediu Lívia viúva de Druso em casamento.
Tibério ter-lhe-à respondido: Sejano se pensas ficar com a mesma condição social, e que Lívia que foi casada com César e depois com Druso, está disposta a passar a sua velhice com um cavaleiro romano, estás enganado.

Supondo que eu permita, tu crês que isso vai ser tolerado por esses que viram o irmão, o pai e antepassados nos mais altos cargos? (Tac.,Ann.,IV,40).

Tudo indica que Tibério não autorizou o casamento de Lívia com Sejano, e não podia porque seria transgredir a ordem social.
Portanto Agripa, casou em terceiras núpcias com Júlia (a Velha), filha do seu grande amigo Augusto e assim entrou na dinastia!

Mais uma vez é nos descendentes de Agripa, que se encontram os potenciais herdeiros do principado.
Entretanto Agripa terá irritado Tibério, e encontrou-se exilado na ilha de Pandaria, (Baía de Nápoles) onde faleceu.
Agripina foi muito prolífica, e dos seus nove filhos ainda sobreviveu o pequeno Caio, do qual o cognome passou à posteridade: Calígula.

No ano 26, Tibério então com 68 anos de idade decide tomar a sua segunda aposentação.
Talvez por ser acessível só por um lado, Tibério escolheu a ilha de Capri, cedendo a uma das características constantes do seu personagem: o gosto da solidão e talvez uma certa paranóia que justifica a sua proteção por falésias altas, e o mar profundo de Capri. (Suet.,Tib.,XLIII).

Este exílio voluntário será o último: Tibério certamente sem remorsos, nunca mais verá Roma.
A sua saída da vida política, foi propícia a Sejano que atingiu o auge do seu poder pessoal.

Foi talvez o historiador Marco Veleio Patérculo (Marcus Velleius Paterculus, 19 a.C.-31 d.C.), contemporâneo de Tibério e Sejano que nos deu uma ideia mais explícita do que era na época o poder do Prefeito do Pretório.

No seu teste, ele compara a aliança de Tibério e Sejano com a de Augusto e Agripa.
É certo que o pai de Sejano era um simples cavaleiro, mas aliado desde tempos imemoriais a antigas famílias patrícias.
Veleio também realça a nobreza de Sejano e insiste na sua dedicação, lealdade, vigor, espírito, e diz que foi o único que ajudou Tibério a suportar o peso do fardo imperial. (Vell.,II,127).

Estas bajulações são o reflexo da força do poder então exercido por Sejano.
Será que ele tentava ser o Agripa de Tibério como o sugere Veleio?
Sejano estava prestes a atingir o seu objetivo, quando Tibério no ano 25, lhe recusou a mão de Lívia, e que por uma curiosa inverção das coisas aconteceu no ano 30.

No ano 31 como colega do imperador, Sejano recebeu o título de cônsuluma honra anteriormente exclusiva aos herdeiros do principado, e pensou-se mesmo que Tibério ia dividir com ele o Poder Tribunício.

Foi confiante e cheio de esperança que no dia 18 de outubro do ano 31, Sejano foi ao Senado e leu uma carta enviada por Tibério.
No início, este faz-lhe um grande elogio pelos serviços prestados, para depois o considerar como um traidor, e exige que o metem na prisão.

Houve grande confusão entre os senadores, alguns fugiram, outros interrogam-se que fazer?
As tropas foram colocadas sobre o comando dum novo Prefeito do Pretório, (Macro): Sejano foi preso e executado sem julgamento.

Tibério-AE 28, emitido durante o consulado conjunto de Tibério e Sejano,
cunhado no ano 31, em Augusta Bilbilis, Espanha Tarraconense.
(Quinto consulado de Tibério)
Anv. Tibério laureado à direita,TI CAESAR DIVI AVGVSTVS
Rev. MVN AGVSTA BILBILIS TI CAESAR V L AELIO SEIANO
CoS no interior duma coroa de louro.
(Ref. RPC I-398, Vagi-484)

Depois de uma conspiração falhada no ano 31 para destronar Tibério, o senado emitiu uma damnatio memoriai (danação da memória) sobre Sejano, e todas as recordações do Pretoriano, estátuas, e bustos foram destruídas.
De igual modo nestas moedas a parte com a legenda (L AELIO SEIANO) foi raspada, e o seu nome foi obliterado de todos os registos publicos.

Tibério-AE 28, emitido durante o consulado conjunto de Tibério e Sejano,
cunhado no ano 31, em Augusta Bilbilis, Espanha Tarraconense.
(Quinto consulado de Tibério)
Anv. Tibério laureado à direita,TI CAESAR DIVI AVGVSTVS
Rev. MVN AGVSTA BILBILIS TI CAESAR V (L AELIO SEIANO)raspado
CoS no interior duma coroa de louro.
(Ref. RPC I-398, Vagi-484)

(O significado da expressão damnatio memoriai e da sanção, era eliminar todos os vestígios dessa pessoa da vida de Roma, como se nunca tivesse existido para preservar a honra da cidade).
Numa cidade que dava grande importância à aparência social, respeito e ao orgulho de ser um verdadeiro romano como requerimentos fundamentais, era talvez o castigo mais severo).

A eliminação dos amigos de Sejano começou de seguida e durou até ao ano 33: os partidários do ex-prefeito são cruelmente massacrados.
As denúncias e a tortura são a regra geral: alguns cometem suicídio e os condenados são privados de sepultura.

Quanto ao motivo de tanta barbaridade os historiadores antigos discordam.
Tácito diz que Sejano tinha um desejo profundo de subir na hierárquia, e utilizava todos os meios para se emparar do poder supremo.
Suetónio também fala na conspiração de Sejano e chama-lhe revolucionário.

Flávio Josefo (Flavius Josephus, 37 ou 38-cerca de 100), também fala da conspiração mas sem dar qualquer explicação.
Será credível esta ideia de conspiração?
Foi a paranóia de Tibério que foi fatal a Sejano?
Suetónio dá-nos uma razão interessante: Sejano terá sido punido, por ter descoberto o ódio sem limite que Tibério tinha para com os filhos de Germânico. (Suet.,Tib.,61).

É evidedente que esta explicação pode ser discutida: Tibério terá ouvido falar da conspiração que originou a morte do seu filho Druso?
As hipóteses são muitas. Talvez  Sejano tenha sido morto, apenas por querer interferir na estratégica dinástica de Tibério.

O fim do reinado de Tibério

Segundo Suetónio nos últinos anos de reinado no seu retiro de Capri, Tibério terá dado livre curso à sua barbaridade continuando a perseguir os seus inimigos políticos, torturando-os de forma horrível. (Suet.,Tib.,43-44, 63-64, 66-67).

O mesmo historiador também escreveu que durante o reinado de Adriano (117-138), as falésias de Capri tornaram-se um lugar altamente turístico.
Mostrava-se ali o local das execuções onde os prisioneiros depois de longas torturas eram por ordem de Tibério precipitadas das falésias.
Em baixo esperavam marinheiros, que com os seus remos acabavam de os massacrar.

Não sabemos que pensar de tais afirmações: será um estilo literário destinado a agradar aos leitores de Suetónio?
Será o reflexo duma espécie de mitologia Tiberiana que, mais de um século depois dos fatos teria deformado e ampliado a realidade?

Hoje é impossível saber, no máximo podemos supor que Tibério duma natureza inquieta e violenta, sofreu muito com a morte do seu filho Druso.

Durante o seu exílio Tibério manteve sempre uma ligação com Roma, que provavelmente ele ainda governava por correspondência.
Embora a sua base fosse Capri, por vezes Tibério percorria as rivagens de Campânia com a frota de Miseno, sem todavia se aproximar de Roma. (Suet.,Tib.,72).

Foi no regresso duma dessa viagens na costa da Itália do sul que Tibério adoeceu.
O imperador faleceu em Lucullus (Miseno), no dia 17 de março de 37, com 78 anos. (Suet.,Tib.,73)

Tácito dá-nos uma versão mais rocambulesca.
No décimo sétimo dia antes das calendas de abril, a respiração de Tibériou parou, e já pensavam que tinha falecido. Mas então quando Calígula se preparava para inaugurar o seu reinado, anunciaram que Tibério já tinha recuperado  a palavra, a visão, e pediu de comer e beber para recuperar do desmaio.
A recuperação de tibério não agradou a todos sobretudo a Calígula.

Macro o novo Prefeito do Pretório terá decidido eliminá-lo? (Tac..,Ann.,VI,50).
Suetónio também fala em rumores de assassinato, mas na realidade Tibério não foi assassinado nem ressuscitou.
Apesar do que nos relata Tácito, Tibério faleceu provavelmente de velhice na sua cama.

Quando em Roma tiveram conhecimento da morte do imperador, o povo saiu para a rua clamando: para o Tibre Tibério, o que nos faz lembrar a prática que ele utilizava com os condenados que eram atirados para o rio Tibre. (Suet.,Tib.,75).

Aqui também não sabemos que pensar desta afirmação. Suetónio parece ter jogado com a proximidade fonética das palavras Tibre-Tibério.
A excitação do povo também se pode explicar pela sequência que ocorre após um longo reinado de mais de vinte anos.

Na realidade os restos mortais de Tibério foram transportados para Roma, onde foi incenerado durante um funeral público, ao qual também assistiu o seu sucessor: Calígula. (Suet.,Tib.,IIIII).

Tibério-E 24 cunhado na Macedónia (data incerta)
Anv. tibério cabeça nua à Direita,
TI CAESAR AVG
Rev. C BAEBIVS  P F L RVSTILELIV BASTERNA II VIR QVI NQ DD
(C. Baebius P F L Rusticelius Basterna Liviri Quinq)
(Ref. RPC-1537)

O nome de Tibério não faz parte de qualquer danação, porque nunca foi apagado nas inscrições.
Também não foi deificado porque era uma prática ainda recente, só César e Augusto tinham beneficiado.


Tibério-Dupôndio cunhado em Comagena (antiga região da Ásia Menor) cerca de 19-20
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVGVSTI F AVGVSTIVS
Rev. Caduceo ladeado por duas cornucópias,
PONT MAXIM COS III IMP VII TR POT XXII
(Ref. RIC-90, BMC-175, RPC- 3869)

Além disso Tibério durante todo o seu reinado, Tibério mostrou grande modestia, e segundo Suetónio sempre se comportou como um simples cidadão. ( Suet., Tib.,XXVI)
Na sua titulatura (au contrário de Augusto) recusou tomar o título de imperador, assim como (Pater Patriae) Pai da Pátria.

Ao contrário dos seus antecessores e muitos dos seus sucessores, Tibério teria alguma hesitação em se fazer passar por um semideus enquanto vivo, ou por um deus verdadeiro após a sua morte.

Se acreditarmos em Suetónio, ele terá recusado que adorassem o seu retrato ou suas estátuas nos templos enquanto vivo. (Suet.,Tib.,XXXVI).

Tibério-Sestércio cunhado em Roma em 36-37
Anv. Quadriga triunfal decorada com Vitórias, transportando troféus de guerra e prisioneiros,
Rev. TI CAESAR DIVI AVGVST P M  TR POT XXXVII S C
(Ref. RIC-60, BMC-113, CBN-91)

Em contrapartida Tácito, diz que uma embaixada de cidades asiáticas veio a Roma pedir autorização para construir um templo em honra do Senado, de Tibério e da sua mãe (Lívia), e que a permissão foi concedida,
Tibério terá ido ao Senado onde os embaixadores discutiam para saber qual a cidade mais digna de receber o novo templo.

Relativamente modesto em virtude do seu título de (Pontifex Maximus) Grande Pontífice, comportou-se como verdadeiro chefe da religião romana, e terá proibido religiões estrangeiras (cultos egípcios e judaicos), obrigando os adeptos da primeira, queimar roupas e objetos sagrados. (Suet.,Tib.,IV,15).

Vêmo-lo também promover o culto nacional imperial romano: dedicou templos a Júpiter e Augusto em Cápua e Nole (Suet.,Tib.,XL), e autorizou a construção dos mesmos templos na Ásia e Tarragona. (Tac.,Ann.,I,78).

Conclusão: O Império segundo Tibério

No seu testamento político, Augusto recomendava que não alargassem mais o Império.
Tibério respeitou esse desejo e não se lançou em mais conquistas. Tac.,Ann.,I,11).
Após ter submetido  a revolta dos exércitos da Germânia e Panóia com a intervenção dos seus filhos Germânico e Druso, a sua política parece ter ajudado a confirmar em todo o Império, o poder soberano de Roma pela diplomacia e, se necessário pelas armas.

No Oriente os reis de Capadócia e Arménia, também foram submetidos.
Reprimiu as revoltas locais na Gália em 21-22, na África (revolta de Tacfarinas) entre 17 e 24.
Em termos de instituições, Tibério também não diminuiu o legado de Augusto.

Utilizou o crime de lesa-majestade para reprimir os seus adversários políticos. (Tac.,Ann.,IV,28-30).
Sejano que em tempos foi muito poderoso, terá tentado introduzir-se na dinastia Júlio-Claudiana, abusando do carácter político de Tibério, mas foi executado.

Apesar duma documentação muitas vezes surpreendente e contraditória, acabamos por acreditar que Tibérionão foi um tirano sádico e lascivo, como o descreve Suetónio.

O imperador teve muitas vezes um comportamento confuso, mas o seu estranho perfil psicológico, não contribuiu a por em causa o regime político instaurado por Augusto, o Principado: o que nos leva a crer que não foi por acaso que Augusto o escolheu para governar Roma.

Cunhagens do imperador Tibério

Tibério não mudou o sistema monetário estabelecido por Augusto.
Nesta matéria assim como em todo o legado do seu antecessor foi muito conservador, e guardou a exclusividade das cunhagens em ouro e prata, (áureos e quinários).
No ateliê monetário imperial instalado por Augusto (longe de Roma) em Lião; aqui Tibério também não mexeu.

A questão das moedas de bronze é mais complicada.
Antes de a evocarmos, podemos notar que um dos aspectos mais marcantes das cunhagens de Tibério, é o pequeno número de tipos diferentes de moedas de ouro e prata que mandou cunhar.
Um desses tipos emitidos em ouro e prata comemoram o divino Augusto.

Tibério-Áureo cunhado em Londres no ano 14
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS
Rev. Augusto laureado à direita, estrela com seis pontas,
DIVOS AVGVST DIVI F
(Ref. RIC-24, BMC-29, Cohen-3)

Tibério-Denário cunhado em Londres no ano 14
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS
Rev. Augusto laureado à direita, estrela com seis pontas,
DIVOS AVGVST DIVI F
(Ref. RIC-24)

Existem igualmente áureos e denários nos quais no anverso podemos ver o imperador conduzindo uma quadriga (triunfal).

Tibério-Áureo cunhado em Lião em 15-16
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS
Rev. Tibério numa quadriga triunfal,
com um cetro encimado com a cabeça duma águia,
IMP VII TR POT XVII
(Ref. RIC-3, BMC,-2, Cohen-47)

Tibério-Denário cunhado em Lião em 14-15
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS
Rev. Tibério numa quadriga triunfal,
com um cetro encimado com a cabeça duma águia,
IMP VIITR POT XVII
(Ref. RIC-4, Cohen-48)
Tibério é representado nas moedas com uma coroa de louro , que é precisamente um dos atributos emblemáticos do triunfador.

Segundo Suetónio, ele recebeu esse triunfo graças às guerras na Ilíria que foi completamente submissa. (Suet.,Tib.,XVI).
Todavia ele foi obrigado a recuar a celebração do seu triunfo dois anos , por causa do desastre sofrido por Varo na Germânia. (Suet.,Tib.,XX).

O evento parece ter ocorrido pouco antes da morte de Augusto.
Entre os anos 15 e 36, Tibério mandou cunhar com alguma frequência quinários em ouro, onde o imperador aparece com a cabeça laureada enquanto Tibério filho de Augusto, (TI DIVI F AVGVSTVS).

No entanto é o tipo PONTIF MAXIM cunhado em áureos e quinários no reverso dos quais aparece Lívia (ou a Pax ?) sentada, a moeda de prata mais comum, e sem dúvida a mais conhecida.

Tibério-Áureo cunhado em Londres no ano 16
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS
Rev. Lívia (ou a Pax) sentada com um cetro na mão direita e um ramo na esquerda,
PONTIF MAXIM
(Este reverso é frequentemente considerado representar Lívia com os atributos da PAX romana (a Paz)).
(Ref. RIC-29, Cohen-15, BMC-30)

Tibério-Denário cunhado em Londres 14-37
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS
Rev. Lívia (ou a Pax) sentada com um cetro na mão direita e um ramo na esquerda,
PONTIF MAXIM
(Ref. RIC I-26, BMCRE-34, BNC-16, RSC-16)

Por ser cunhada na época de Jesus Cristo, esta moeda tem a reputação de ser mecionada na bíblia, (faria parte dos trinta dinheiros de Judas?) mas como não está explicitamente descrita nos evangelhos nada é certo.
(Ver numistória, “Na procura do dinheiro de Judas” artigo do 14-09-2012)

Em contrapartida os numismatas continuam a interrogar-se se a figura sentada no reverso é Lívia mãe de Tibério ou a «Pax Augusta».
Um dos argumentos contra a identificação desta figura como Lívia, é porque o seu nome não aparece na moeda.
Junta-se também a anedota sobre Tibério, em que ele ficou indignado de ser questão no Senado de juntar aos seus títulos, o de filho de Lívia por analogia com o de filho de Augusto.

Aqui também vemos que nada é impossível, no entanto segundo Harold Mattingly, naquela época apesar das contestações o povo identificou-a como Lívia.
(Harold Mattingly: Especialista em numismática romana, a ele se deve a inciativa da redação do Roman Imperial Coinage (RIC), monumental catálogo cronológico de moedas romanas).

Ainda que os diferentes tipos de cunhagens no reinado de Tibério não sejam muitos, a continuidade e monotomia destes tipos requer alguns comentários.

Augusto-Áureo cunhado em Londres entre 2 a.C. e 14 d.C..
Anv. Augusto laureado à direita,
CAESAR AVGVSTVS DIVI F PATER PATRIAI
Rev. Caio e Lúcio vestidos com a toga apoiados em escudos, simplum, lítuo, e duas lanças,
(Ref. RIC-206, Calico-176a)

Por uma questão de temperamento pessoal, Tibério ter-se-à contentado de continuar a política simplista iniciada por Augusto.
Devemos acrescentar que Tibério após a sua ascenção ao poder supremo do Império, manteve-se sempre em Roma ou na Itália, retardando sempre uma eventual digressão nas províncias ou aos exércitos.

Também é possível que esta distância entre o imperador e o ateliê monetário lionês, promoveu a adoção de tipos de moedas repetitivos e esteriotipados.

Em relação às moedas de bronze, a situação é muito diferente a todos os níveis.
Em termos de legislação monetária, Augusto preferiu conceder ao Senado uma parte do direito de cunhar moeda, que sempre lhe pertenceu durante o período da República.

Este direito concedeu ao Senado Romano o direito de emitir moedas de bronze: asses, (em latim AES) nos quais ele estampilhou a marca da sua aprovação: S C, abreviação de Senatus Consulto. 

Tibério-Asse cunhado em Roma no ano 16
Anv. Tibério cabeça nua à esquerda,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVST IMP VII
Rev. Lívia sentada à direita com um cetro na mão esquerda e uma pátera na direita,
PONTIF MAXIM TRIBVN POTEST XVII  S C
(Ref. RIC I-34, Sear-1769)

Tibério-Asse cunhado em Roma em  22-23
Anv. Tibério cabeça nua à esquerda,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVST IMP VIII
Rev. PONTIF MAXIM TRIBVN PROTEST XXIII S C
(Ref. RIC-44, Cohen-25, BMCRE-91)

Tibério-Asse cunhado em Roma em 34-35
Anv. Tibério laureado à esquerda,
TI CAESAR DIVI AVG F AVGVST IMP VIII
Rev. Caduceo, PONTIF MAXIM TRIBVN POTEST XXXVII S C 
(Ref. RIC I-59, BMC-120, Cohen-22)

Nestas moedas o direito da efígie é exclusivo ao imperadorno reinado de Tibério, e estendeu-se até Calígula nos asses, mas não nos sestércios.

O imperador não abandonou completamente o anverso das moedas de bronze: estas mencionam no princípio o título imperal.
Uma considerável exceção é fornecida por algumas moedas (abundantes) ditas de restituição incluindo aquelas que comemoram o Divino Augusto, (DIVVS AVGVSTVS).

Reinado de Tibério-Asse cunhado em Roma em 22-23
Anv. Augusto cabeça nua à esquerda,
DIVVS AVGVSTVS PATER
Rev. Altar, PROVIDENT S C
(Ref. RIC I-81, RCV-1789)

Temos a certeza que foram cunhadas após a morte de Augusto porque este aparece divinizado, mas em ausência de legenda explícita, a sua atribuição a Tibério foi durante muito tempo discutida.

As célebres moedas tipo altar de Lião, são frequentes com as legendas ROM/a  ET AVG/vstvs.

Tibério-Sestércio cunhado em Lião em 12-14
Anv.Tibério laureado à direita,
TI CAESAR AVGVSTI F IMPERATOR VII
Rev. Altar de Lião,  ROM  ET AVG
 (Ref. RIC I-248, (Augustus), BMCRE-580 var., Cohem-35 var., BN-1761)

Tibério-Asse cunhado em Lião em 12-14
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAESAR AVGVSTI F IMPARAT VII
Rev. Altar de Lião,  ROM ET AVG
(Ref. RIC I-245, (Augustus), BMCRE-585, BN-1769, (Augustus),Cohen-37)

Cunhadas na oficina monetária de Lião, essas moedas (Sestércios, asses, semisses e quadrantes), mostram que apezar da retrocessão dos direitos monetários ao Senado, o imperador não pensava atribuir-lhe uma exclusividade sobre as moeda sde bronze.
Em difinitivo, o poder monetário do imperador é comparável com todos os outros seus encargos; o aspecto mantem-se, mas é ele que detém as rédeas do poder.

Para completar este episódio sobre as moedas de bronze, vamos evocar brevemente as numerosas cunhagens provinciais emitidas no reinado de Tibério.
Essas moedas ditas provinciais, são produzidas pelos municípios em quase todas  as regiões do Império.

Tibério-Dracma cunhado em Cesareia (Capadócia) em 32-33
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAES AVG PM  TR P XXXIV
Rev. Druso à esquerda,
DRVSVS CAES TI AVG F COS P IT
(Ref. RIC-94, RPC-3261, Sydenham-43)

Tibério-AE 17 cunhado em Mérida, data incerta.
Anv. Tibério laureado à esquerda,
TI CAES AVGVSTVS PON
Rev. Porta de Mérida,
COL AVGVSTA EMERITA
(Ref. RPC-42, Burgos-830)

Tibério-AE 24 cunhado em Tarraco em 14
Anv. Tibério laureado à direita,
TI CAES AVG PON MAX TRIB POT
Rev. Druso e Lívia,
IVL AVGVSTA DRVSVS CAES TRIB POT IV C V T  
(Ref. RPC-233, SNG Cop-528)

Tibério-AE 24 cunhado na Macedónia (data incerta)
Anv. Tibério cabeça nua à direita,
TI CAESAR AVG
Rev. C BAEBIVS P F L  RVSTICELIV BASTERNA IIVIR QVINQ DD em cinco linhas
(C Baebius P F L Rusticelius Basterna Liviri Quinq)
(Ref. RPC-1537)

Tibério AE-19 cunhado em Panormus (Palermo) data incerta
Anv. Tibério cabeça nua à direita,
PANORMITANORRVM
Rev. Lívia com uma coroa de espigas à direita, AVGVS
(Ref. RPC-642)

Tibério-AE 29 cunhado em Syrtica Oea (Trípoli) data incerta
Anv. Tibério cabeça nua à esquerda,
Rev. Apolo à direita e citarra,
(Ref. RPC-1834, MAA-30)

Estas moedas coloniais que forneciam os mercados locais refletem a imagem do Império ou seja, muitos tipos diferentes.
O Império Romano foi construído pelas armas mas também pela associação voluntária e colonização.

Quando uma cidade aliada dispunha do seu próprio sistema monetário, Roma guardava-o. Exemplo: o Egito romano conservou um sistema monetário antigo de origem grega.
Em contrapartida, os imperadores exercem um controle político único sobre as moedas locais que são emitidas (ou não) com o seu acordo, com a  sua efígie e titulatura, ou da família imperial.

Tibério e Divino Augusto-Tetradracma cunhado em Alexandria em 20-21
Anv. Tibério laureado à direita,
TIBEPIOΣ KAIΣAP ΣEBAΣTOΣ
Rev. Augusto com coroa radiada à direita
ΘEOΣ ΣEBAΣTOΣ LIΔ
(Ref. RPC-5089, Sear-1774)

Tibério-AE cunhado em Edessa (Macedónia ou Macedônia), data incerta
Anv. Tibério cabeça nua à direita,
TI KAISAR SEBASTOS
Rev. Lívia à direita,
SEBASTH EDESSIWN
(Ref. RPC-1525, Varbanov-3582)

Tibério-AE 15 cunhado em Neocasarea, (Filadelfia-Lídia,
atual Alasehir-Túrquia) data incerta,
Anv. Tibério com coroa radiada à direita,
TIBERION CEBACTON
Rev. Raio alado, NEOKAICAREIC
(Ref. RPC-3017 a, Waddington-6359, SNP Cop-373)

As moedas imperiais e senatoriais cunhadas no reinado de Tibério refletem pouca atualidade, no entanto surgiu um caso.
Uma moeda senatorial cunhada em Roma em 22-23, com a legenda CIVITABIBVS ASIAE RESTITVTIS .

Tibério-Sestércio cunhado em Roma em 22-23
Anv. Tibério sentado numa cadeira curul com
uma pátera na mão direita e um cetro na esquerda,
CIVITABIBVS ASIAE RESTITVTIS
Rev. TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS P M TR POT XXIII S C
(Ref, RIC-48, Cohen-3, BMC-70)

A restituição ou antes restauração das cidades da Ásia das quais aqui é questão, é esclarecida por uma passagem de Suetónio que diz: Tibério não concedeu a mínima liberdade às províncias, exceto à Ásia, onde algumas cidades foram destruídas por terramotos.
(Suet.,Tib.,XLVIII).

Este sestércio comemora o gesto nobre de Tibério com as cidades da província da Ásia em torno de Sardes, vítimas dum tremor de terra no ano 17, quando ele destribuiu enormes somas de dinheiro para restaurar as cidades devastadas.

Aqui o Senado quis honrar o imperador  dedicando-lhe este sestércio,  cunhado no momento da emissão dinástica que associava ao seio da Domus Imperial, Druso filho de Tibério que acabava de receber o Poder Tribunício.

Neste caso, o evento da atualidade está relacionado com a emissão da moeda, porque segundo Suetónio, existem outros exemplos que nem sempre estão bem esclarecidos.
Exemplo: o Templo da Concórdia, representado no reverso dum sestércio cunhado no ano 35, que parece ter sido emitido no momento da sua restauração.

Tibério-Sestércio cunhado em Roma em 35-36
Anv. Templo da Concórdia: a Concórdia ao centro sentada num trono, ladeada pelas estátuas de Mercúrio à direita e Hércules à esquerda.
Rev. CAESAR DIVI AVG F AVGVST P M TR POT XXVII S C
(Ref. RIC I -61, BMCRE-116, Cohen-69 VF)

Contudo o caráter dominante da cunhagem de Tibério, não é o mais interessante.
O que percebemos em primeiro lugar, é o aspecto dinástico das moedas.

Ns moedas imperiais é natural que a efígie do imperador seja quase sempre omnipresente.
O anverso nas cunhagens do Senado de Roma não apresentam o retrato imperial, e quando esta excepção acontece, o imperador aparece na totalidade e sentado na sua cadeira curul.

Sobre a fisionomia de Tibério, Suetónio conta a seguinte anedota.
Tibério tinha olhos muito grandes, e coisa extraordinária, também viam de noite e mesmo na escuridão completa.
Este fenónemo acontecia quando acordava, mas durante pouco tempo. (Suet.,Tib.,VLVIII).

Podemos interrogar-nos sobre a origem e veracidade deste poder extraordinário, que permitia a Tibério ver de noite.

O fato de Suetónio dizer que o imperador tinha os olhos grandes, não deixa de ser interessante, porque nas estátuas e bustos Tibério não é representado com olhos exorbitantes.
Em contrapartida nas moedas são bastante grandes (esbugalhados): direi um pouco desproporcionados.

Também nos podemos interogar se a imagem do imperador, nomeadamente os retratos veiculados pelas moedas, não terão servido a Suetónio para alimentar esta lenda de poderes sobrenaturais de Tibério.

Ou então o imperador era nictalope (doença ocular que  dá a faculdade de ver à noite).
Seja como for não podemos concluir a questão dos olhos de Tibério que por suposições.

Além da imagem de Tibério, as moedas deste período apresentam numerosos membros da dinastia mortos ou vivos.

Augusto fundador do Império e pai adotivo de Tibério, é representado com muita frequência nas moedas da época de Tibério nomeadamente nas moeda senatoriais.
Podemos notar que depois da sua deificação, a tradicional coroa de louro foi abandonada a favor duma coroa radiada signo de divindade, e que o pai biológico de Tibério (Tiberius Claudius Neron) foi excluído da numismática.

Tibério –Dupôndio cunhado em Roma em 22-23
Anv. Divino Augusto com coroa radiada à esquerda,
DIVVS AVGVSTVS PATER
Rev. Templo exastilo com frontão triangular, S C
(Ref. RIC I -74 (Tiberius), MIR 2,55-5, BMCRE-142 (Tibérius), Cohen-251)

As moedas apresentam igualmente imagens dos diversos herdeiros do Império, particularmente de Druso, bem representado em moedas municipais.

Tibério-AE 19 cunhado em Pafos (ou Paphos-Chipre) em 22-23
Anv. Druso cabeça nua à direita,
DRVSVS CAESAR
Rev. Zeus Salaminos em pé, em frente do templo de Afrodite de Pafos.
(Ref. RPC I-3921)

Uma moeda municipal de Cartagena (Espanha) apresenta no anverso a efígie de Tibério, e no reverso o jovem Caius (Calígula), que depois da morte de numerosos herdeiros, obtem finalmente o governo do Império.

Tibério-AE 30 cunhado em Cartagena em 37-41
Anv. tibério laureado à esquerda,
TI CAESAR DIVI AVGV F AVG PM
Rev.Calígula cabeça nua à esquerda,
C CAESAR TI N QVINQ IN V I N K
(Ref. RPC-182, CNG-502, SGI-337, Cohen-245)

Podemos constatar que as moedas não deixam práticamente refletir nada das muitas conspirações, numerosas mortes e ultrajes do poder, relatados por fontes literárias.
As moedas dão uma impressão de objetividade. Na verdade, elas só deixam ver as imagens que o “poder” autorizava.

Se acreditarmos nas fontes literárias, os historiadores antigos (sobretudo Suetónio) dizem que Tibério tinha uma reputação modesta e recusava as honras.

Como primeiro nome, recusou o título de imperador (imperator,oris), Pai da Pátria (Pater Patriae), não aceitou a coroa cívica nem o título de Augusto que tinha herdado, mas aceitou as saudações imperiais, exemplo: TRI POT XVI IMP VII.
O título de Augusto,  só o juntava ao seu nome quando escrevia uma carta a algum soberano ou governante. (Suet.,Tib.,XXVI).

Existem algumas inscrições lapidárias nas quais ele se intitula: IMP TI CAESAR AVG (Imperador Tibério César Augusto), e não a sua titulatura habitual: TI CAESAR AVG (Tibério César Augusto).

Podenos notar que tanto nas moedas como nas inscrições lapidárias, a afirmação de Suetónio segundo a qual Tibério teria recusado o nome de Augusto, não se verifica.

Tibério-Quinário cunhado em Londres em 22-23
Anv. Tibério laureado à direita,
TI DIVI F AVGVSTVS
Rev. Vitória sentada num globo com uma coroa de flores nas mãos,  TR  POT  XXIIII
(Ref. RIC I -8, Biagi-174, BMC-16, Giard-128, 2)

Em contrapartida as coroas cívicas ou outras, Tibério nunca as recusou.
Desde o seu triunfo em Roma pouco antes da morte de Augusto, salvo em raras excepções, a coroa de louro do triunfador é constante nas moedas de Tibério.

Quanto ao título PATER PARIAE, moedas e inscriçoes lapidárias confirmam os ditos de Suetónio: Tibério não adotou este título.

Finalmente podemos dizer que a titulatura é relativamente modesta em comparação aos extensos títulos que adotaram alguns imperadores.
No entanto esta modestia não é muito relativa: sob Tibério os títulos não são permanentemente fixos.

A palavra imperador seja de função seja de nome, conheceu algumas flutuações devido ao novo regime inventado por Augusto.

O Império sob Tibério, ainda se encontava em fase de consolidação, o novo regime político era designado de “Principado” e não por “Império”.
Em todos os aspetos, a cunhagems de Tibério é muito instrutiva.

MGeada

Bibliografia
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http://karl.claerhout.pagesperso-orange.fr/page2.htm