quinta-feira, 26 de maio de 2016




 
CLEÓPATRA THEA RAINHA SELEUCIDA

Na memória colectiva o nome de Cleópatra é associado ao Egito através de Cleópatra VII (A Grande) 69-30 a.C.. No entanto uma das suas antepassadas na segunda metade do século II a.C.,  teve na história do reino da Síria, um papel importante dominando os homens, e não subindo a influência destes como aconteceu com a primeira aqui citada.

Filha de Ptolemeu VI e da esposa e irmã deste Cleópatra II: Cleopatra Thea foi esposa de três reis sucessivos, regente de um quarto, e será durante trinta anos, o único fio condutor da história muito movimentada do Reino Selêucida, entre 151 e 120 a.C.

Cleópatra que no início terá sido apenas um simples brinquedo diplomático nas mãos do seu pai Ptolemeu VI, depressa ganhou um imenso prazer pelo poder, ao ponto de favorizar o assassinato do seu segundo esposo e um dos seus filhos, antes de ser vítima dos  seus próprios artícios.

A moral universal rejeita mesmo por procuração o assassinato de um esposo ou filho, mas não vamos aqui julgar Cleópatra porque mal conhecida, não a podemos culpar de todos os pecados. Alguns factos políticos e costumos carregados de influências faraónicas e orientais, permitem de melhor a compreender.

 Breve história do período
   
Cleópatra Thea entrou na história do domínio dos selêucidas por vontade do seu pai Ptolemeu VI Filometor, que como todos os Lágidas, tinha uma preocupação constante de se assegurar o acesso às ricas regiões do Próximo Oriente Mediterrânico, seja por alianças matrimoniais ou políticas de circunstância ou então; contribuindo ao enfraquecimento do vizinho por uma sábia política de intrigas entre diversos pretendentes, cidades rivais, ou ainda entre judeus e helenos.

São estas as maiores revindicações da política egípcia dos descendentes de Seleuco I.
Assim quando Alexandre Balas, que vivia na corte do rei Átalo de Pérgamo (Bérgamo) se proclamou filho de Antíoco VI, por ser muito parecido com o defunto e, entra em competição com o soberano ligítimo Demétrio I Sóter; Ptolemeu disponibilizou-lhe um exército e a mão da filha para selar esta aliança.

Este casamento foi comemorado pela emissão de um tetradacma com os bustos dos jovens soberanos, e no qual a jovem rainha (da qual se desconhece a data de nascimento) ocupa o primeiro lugar.

Reino Selêucida
Tetradracma  ático cerca de 150 a.C..
Anv. Bustos à dir. de Cleópatra, e Alexandre I
Rev. Zeus sentado num trono à esq. com uma Vitória na mão direita, e um cetro na esquerda

Estáter (ouro) cunhado em 151/150 a.C..
Anv. Cleópatra Thea à dir. com véu, diadema e coroa.
Rev. Dupla cornucópia e legenda.

Parte do seu dote terá sido constituído com (raríssimas) moedas de ouro com a sua efígie.
Recebido como libertador na Sicília e na Síria; após  a morte de Demétrio no ano 150, Alexandre tomou o controlo de todo o reino: beneficiou do reconhecimento do Senado Romano e ajuda militar dos judeus, em troca de algumas decisões políticas,  motivo de muitas dificuldades ulteriores.

 Alexandre I Balas, (primeiro esposo de Cleópatra).


Tetradracma cunhado em Antióquia, 148/147 a.C.
Anv. Alexandre I com diadema à dir..
Rev. Zeus sentado à esq. com um cetro na mão esquerda, uma Vitória a coroá-lo na dir. e legenda.

Dracma tipo Héracles cunhado em Antioquia, 150/145 a.C..
Anv.Alexandre I com diadema à dir.
Rev. Apolo nú sentado no omphalos (ónfalo) à esq. com uma flecha 
na mão direita, a esquerda apoiada num escudo e legenda.

Uma dessas decisões foi  conceder ao grande sacerdote Jonathan governador da Judeia a  hereditariedade do seu título. Ele e os seus sucessores irão a partir de então negociar a sua ajuda nos conflitos que vão amotinar a dinastia. 

Depois de abandonar um marido muito libertino do qual teve um filho, Cleópatra regressou para junto do pai. Pouco tempo depois,  Alexandre I  encontrou-se por sua vez em posição de desafiar o seu novo rival, Demétrio II Nicator, filho do precedente rei que entretanto desembarcou nas cotas da Síria com um  exército constituído  por mercenários no ano 147/146 a.C..

Ptolomeu que tentou socorrer Alexandre, viu o seu exército virar-se a favor do rival e instalá-lo em Antioquia.
Cleópatra que entretanto tinha viuvado após o assassinato de Alexandre pelos seus próprios oficiais em troca de uma remissão, o Lágida pode casá-la com o novo soberano.

 Demétrio  II, (Segundo esposo de Cleópatra).

Tetradracma do primeiro reinado (146/138) cunhado em Tiro, 146/145 a.C..
Anv. Demétrio II com diadema à dir.
Rev. Águia em pé à esq. sobre a proa de um navio.

O jovem Demétrios II, tinha apenas onze anos quando herdou o trono paternal, ladeado por uma esposa sem dúvida sensilvelmente mais velha que ele.

Depois da morte do seu poderoso protetor no ano 145, ele revelou-se incapaz de controlar os seus mercenários o que originou uma grande  anarquia. A guarnição de Apameia revoltou-se e proclamou rei o jovem filho de Alexandre e Cleópatra Thea, sobre a tutela de um militar, Díodoto Trifon.

Antíoco VI não teria mais de 5 anos em 144 a.C., quando os rebeldes com o auxílio dos judeus o instalaram em Antióquia obrigando Demétrios a refugiar-se nas suas províncias orientais.

 Antíoco VI, Dionísios, (filho de Cleópatra e de Alexandre I).

Tetradacma cunhado em Antioquia, 143/142 a.C..
Anv. Antíoco VI à dir.
Rev. Os Dióscuros galopando à esq. e legenda.

Dracma cunhado em Antioquia, 142 a.C..
Anv. Antíoco VI com diadema à dir.
Rev. Apolo sentado no omphalos(ômfalo) à esq. com com uma flecha na mão direita, e a esquerda apoiada num escudo.

Breve instalação que só durou até 142 a.C., abrevigiada por doença ou,  por instigação do seu protector Trífon, que iria suceder-lhe.
Nestas difícies circunstâncias, Demétrios II não hesitou virar-se para o Oriente e declarar guerra aos Partos.

Preso no ano 139 a.C., foi um captivo previlegiado na Trácia durante dez anos, deixando a assim a Cleópatra a possibilidade de contrair novo casamento, com o seu jovem irmão Antíoco Evérgeta dito Sideta (ref.à cidade de  Sida, também conhecida por Side) precedentemente instalado em Rodes.

Com este casamento Cleópatra preservou a continuidade da dinastia. Segundo a história, Demétrios terá desposado Rodoguna uma princesa arsácida mas, terá sido uma manobra do rei parta Fraates II, ele mesmo casado com uma princesa selêucida e, que teria interesse  com a aliança entre os dois reinos.

 Antíoco VII, (terceiro esposo de Cleópatra).

Tetradacma cunhado em Antioquia, 138/129 a.C..
Anv. Antíoco com diadema à dir.
Rev. Atena em pé à esq., com uma Vitória na mão direita, 
uma lança na esquerda, e legenda.

Antíoco VII, terceiro esposo de Cleópatra , que decidiu restabelecer a união dos dois reinos; eliminou Trifon, tomou o controlo de alguns territórios partas (Babilónia, Média) no ano 136 a.C., e retomou o controlo da Palestina que se tinha proclamado independente sob a direcção do Soberano Pontífice João Hicarno no ano 113 a.C..

Mas uma segunda campanha contra os partos foi-lhe fatal: vencido e morto no ano 129 a.C., o seu exército foi incorporado ao dos vencedores.

Entretanto, Fraates libertou Demétrio II e,  no ano 130 a.C., pô-lo à frente de um pequeno exército, para fazer diversão contra o seu irmão. Após a morte deste último Fraates tentou em vão recuperar o antigo  captivo que não só  mudou de opinião, como também reclamou a restituição da sua esposa e do seu reino, agora reduzido à Cecília, Síria e Fenícia.

Demétrio II, (segundo esposo de Cleópatra "segundo reinado").

Tetradacma  (segundo reinado) cunhado em Antioquia,129/128 a.C..
Anv.Demétrio II com diadema e  barba à dir.
Rev. Zeus sentado num trono à esq. com uma Vitória na mão esquerda a coroá-lo, um cetro na esquerda, e legenda.

Podemos imaginar a desilusão da mulher ao encontrar um esposo fisicamente bastante mudado. Uma mulher que apreciava o  poder e, que poderia ter continuado graças à tutela sobre um dos seus filhos.

Tetradracma (segundo reinado) cunhado em Tiro, 129/128 a.C..
Anv. Demétrio II com diadema à dir.
Rev águia à esq. sobre a proa de um navio, massa, folha de palmeira e legenda.

(Por razões que desconhecemos, o ateliê monetário de Tiro continuou a representar o rei ainda jovem durante o segundo reinado, enquanto os outros ateliês  o mostram mais velho e com barba: provavelmente como ele seria  após o seu cativeiro pelos partos).

A partir daí podemos ver algum maquiavelismo quando ela conseguiu convencer seu marido a organizar uma campanha militar contra o Egito, apesar de dispor forçosamente de um exército reduzido.

Isto, para ajudar a sua mãe Cleópatra II, em conflito com o seu irmão esposo Ptolemeu VII, e, que procurou refugio junto da sua filha Thea, com o tesouro real.
Antes do confronto, Demétrios foi obrigado a retirar-se para fazer frente a um novo ursupador, Alexander Zebina (um escravo) e reconhecido por Antioquia revoltada, como provável filho de Antíoco VI, que também pediu apoio ao soberano lágida.

Durante este novo episódio, (Cleópatra, talvez afastada do poder), refugiou-se com os filhos na cidade fortificada de Acco (Ptolomaida). Quando no fim duma grande guerra civil Ptolemeu depois de vencido, ali procurou refúgio, Cleópatra vingou-se,  refusou-lhe a entrada, condenando-o assim à morte a curto prazo.

Ao enviar o esposo a uma morte certa,  Cleópatra  projectava antes de nada substituí-lo. 
O tetradracma que a representa só com com o diadema (símbolo da monarquia divina) e o título Cleópatra deusa da Abundância  não deixa dúvidas.

Tetradracma cunhado em Acco (Ptolomaida), 126/125 a.C..
Busto de Cleópatra à dir., com com véu e coroa.
Rev. Dupla cornucópia e legenda.

Para melhor se assegurar esta coroa, tinha que mandar assassinar o seu filho mais velho, este também libertado pelos partos, com a finalidade de originar diferendos e, que tomou o  titulo de rei no ano 126-125 a.C., sob o nome de Seleucos V.

No entanto ela foi obrigada a um compromisso sobre a influência do seu tio Ptolemeu VII, que inverteu novamente as suas alianças abandonando Alexandre e previlegiando o segundo dos filhos de Demétrio e Cleópatra.

Este com 15 ou 16 anos, foi educado em Atenas, casou com uma princesa egípcia e sua mãe foi obrigada a aceitá-lo como co-soberano. Associação de interesse que na opinião dos egípcios devia conter a ameaça parta, reconstruindo uma espécie  de unidade territoriale, que mais uma vez foi favorável  a  Cleópatra, (se nos basearmos na numismática).


Reino Selêucida 
Tetradracma cunhado em Damasco no ano 121 a.C.
Anv. Bustos à dir. de Cleópatra com véu, diadema e coroa, e Antioco com diadema.
Rev. Zeus sentado num trono à esq. com a Niké na mão direita, um cetro na esquerda e legenda

Com Alexandre definitivamente eliminado 123-122 a.C., ela terá pensado que seria  tempo de eliminar este jovem que com a idade, só poderia ser cada vez mais ambicioso. Assim um dia em que Antíoco VIII regressava da caça, ofereceu-lhe uma taça de vinho envenenado.

Todavia o filho folião alegre mas prudente, e talvez pouco habituado a tanta gentileza por parte da mãe, obrigou-a a beber  a taça de vinho.
Assim teve início o reino pessoal de Antíoco que tomou o nome de Epifane.

 Antíoco VIII, (filho mais novo de Cleópatra e Demétrio II).
Tetradacma cunhado em Antioquia, 121/114 a.C..
Anv. Busto de Antíoco com diadema à dir.
Rev. Zeus sentado num trono à dir. com uma Vitória na mão direita a coroá-lo, um cetro na esquerda, e legenda.

Um reino que lhe será contestado durante vinte anos pelo seu meio-irmão Antíoco IX, filho de Antíoco VII (Sedéte).

Antíoco IX, (filho mais velho de Cleópatra e Antíoco VII).


Tetradacma cunhado em Antioquia 109/108 a.C.
Anv. Busto de Antíoco IX com diadema à dir.
Rev. Atena à esq. com a Nike na mão direita, lança na esquerda, e legenda.

MGeada

Bibliografia
Bouche-Leclerq : Histoire des Seleucidas, 1913
Davis et Kraay : The Helllenistic Kingdoms, 1973
Louguet: L’imperalisme Macedonien et Helllénisation de L’Orient, 1926
Macurdy- Grace Harriet :  Hellenistiq Queens, 1932
M. Galléazzi : Revista Monnaies  n°1, Maio - Junho 1991
M. Galléazzi : Revista Monnaies  n° 2, Julho - Agosto 1991


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